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Foto do escritorMarcelo Arantes Alvim

Análise de Balanços: o triângulo do desempenho

Atualizado: 12 de abr. de 2022

Eu já fui professor de Contabilidade e Análise de Balanços em cursos de graduação e pós-graduação por alguns anos. Todos os indicadores propostos pelos livros pertinentes ao assunto são muito interessantes e normalmente são agregados em grandes grupos de leitura de desempenho da empresa. Todavia, eu sempre notava a angústia dos alunos frente aos inúmeros indicadores, sendo que a proposta de alguns destes indicadores não apresentam muita utilidade prática, enquanto outros apresentam propostas que criam sobreposição de objetivos, para dar praticamente a mesma noção de desempenho contábil histórico. O resultado é que os inúmeros indicadores acabam desmotivando os alunos a realizarem uma análise mais assertiva quanto à trajetória econômica, financeira e de crescimento da empresa.


Triângulo da Análise

Pensando em minimizar o desânimo dos jovens frente ao caminhão de indicadores, eu criei a proposta do Triângulo da Análise. Não se trata de nenhuma inovação a respeito de indicadores, uma vez que trabalho com aqueles tradicionalmente propostos na literatura já consagrada no mercado. Eu simplesmente agrupo a análise contábil do desempenho da empresa em três ângulos, conforme pode ser observado na figura abaixo.



Em primeiro lugar vem o ângulo do desempenho econômico cuja proposta é apresentar uma combinação de no máximo quatro ou cinco indicadores que se complementam para nos dar uma visão sobre se a atividade principal da empresa cria valor para o acionista ou não. Estes indicadores relacionam o lucro operacional ao capital operacional líquido empregado para sustentação da atividade operacional. Por este ângulo conseguimos verificar se a empresa gera retorno operacional e qual a origem deste retorno, se vem da margem de lucro ou se vem da produtividade do capital empregado, o denominado giro do ativo. Esta visão já foi proposta pelo famoso modelo Du Pont e é muitíssima interessante do ponto de vista da clareza da análise causa e efeito. Ainda complementando este ângulo eu costumo instigar os alunos a estimarem o custo médio ponderado de capital (CMPC) da empresa (uma análise híbrida que combina informações de balanço e informações extra contábeis de mercado). Depois desta estimativa é possível calcular se a empresa criou valor para o acionista ao confrontar o retorno sobre o capital operacional (ROIC em inglês) com o CMPC. Uma boa empresa do ponto de vista econômico tem que gerar ROIC acima do CMPC, o que significa, na linguagem dos economistas neoclássicos, Lucro Econômico (ou Economic Value Added-EVA, na linguagem dos consultores modernos).


Em segundo lugar vem o ângulo do desempenho financeiro (ou de liquidez financeira) cuja proposta é apresentar também no máximo uma combinação de quatro ou cinco indicadores que se complementam, para nos dar uma visão da capacidade financeira de pagamento de compromissos da empresa. Não basta somente gerar lucro econômico é importante que esta geração se converta em capacidade de caixa para honrar compromissos, principalmente no curto e médio prazo. Neste ângulo eu costumo propor o famoso modelo Fleuriet (um modelo genuinamente francês de análise da capacidade financeira da empresa, que importamos da França através de uma tese de doutorado brasileira de um francês chamado Michel Fleuriet e que por isso aqui ficou conhecido como modelo Fleuriet). Esta forma de analisar os balanços segrega as contas de ativo e passivo em ativos circulantes operacionais de curto prazo, operacionais de longo prazo e erráticas (ou financeiras) de curto prazo. A mesma classificação vai para o lado passivo. Esta segregação nos permite comparar duas grandezas importantes do ponto de vista da capacidade financeira de uma empresa: o capital de giro (um fundo, uma origem de recursos) e a necessidade de capital de giro (um investimento ou uma aplicação de recursos). Do confronto entre essas duas grandezas nasce o saldo de tesouraria, um montante de final de período que nos diz se a empresa gera recursos financeiros que formam um colchão de liquidez capaz de garantir os pagamentos de compromissos assumidos, principalmente os fixos. Portanto, quanto maior o CDG em relação à NCG, maior o ST e maior é a liquidez. Esta maneira de enxergar o balanço dispensa um indicador tradicional que pouca utilidade tem para uma empresa em ritmo continuidade operacional: os famosos índices de liquidez (corrente, geral, seca, etc). A NCG está atrelada à atividade operacional da empresa e ao ciclo financeiro (os famosos prazos de estocagem, recebimentos e pagamentos). Uma alteração drástica no volume de atividade operacional da empresa, aliada a uma alteração também drástica no ciclo financeiro, a empresa pode ser ver diante da insuficiência de capital de giro e ter a sua liquidez comprometida. Por isso este ângulo é tão importante na análise de balanços. É pena que os padrões contábeis não permitem as empresas apresentarem os balanços de acordo com o modelo francês, o que nos obriga a fazer isso de forma extra balanço oficial, gerando um trabalho a mais de modelagem.


Em terceiro lugar vem o ângulo do crescimento e risco. Neste ângulo eu proponho a interligação de indicadores relacionados ao crescimento do lucro vis a vis o crescimento da receita. Quanto percebemos ao longo dos anos o crescimento do lucro maior que o crescimento da receita, percebemos uma empresa capaz de administrar bem seus custos e despesas, sendo que o contrário nos revela potenciais problemas de liquidez no futuro, pois custos crescendo mais que receita podem levar a déficit operacional de caixa e a dificuldades financeiras. Podemos dizer que esta comparação é uma leitura da sustentabilidade econômica da empresa.

Combinada com esta análise vem também a análise de risco, onde proponho o indicador tradicional dívida líquida/EBTIDA.

Pela análise destes três ângulos conseguimos, acredito eu, fechar nosso julgamento sobre o desempenho contábil da empresa ao longo do tempo.


O diagnóstico

Podemos depreender da analise triangular proposta que uma boa empresa para investir deve apresentar estes três ângulos evoluindo de forma positiva no tempo. A empresa deve crescer, controlando riscos e custos, gerando saldo de tesouraria capaz de garantir os compromissos financeiros de curto e médio prazo e criando valor para o acionista.


Necessário mas não suficiente

Uma coisa é o desempenho contábil histórico da empresa e outra coisa é o desempenho de mercado da mesma, em se tratando de empresa com ações listadas em bolsa com razoável liquidez. Meu modelo proposto é necessário mas não suficiente nestes casos. Você pode encontrar uma empresa que apresente desempenho excelente nos três ângulos contábeis propostos mas não necessariamente esta será uma empresa boa para participar como investidor comprando suas ações, pelo simples fato de que todo esse excelente desempenho histórico muito provavelmente já estará precificado na hora da sua ordem de compra, ou seja, o preço da ação estará alto o suficiente para premiar os gestores pela sua performance gerencial. Caso você compre a ação da empresa com seu bom desempenho histórico precificado, a sua taxa interna de retorno (TIR) futura poderá não se parecer com o ROIC contábil passado. Eu sempre instigo meus alunos a criarem um quarto ângulo nestes casos: o ângulo que agrega indicadores fundamentalistas de mercado como evolução do preço da ação, retorno histórico, volatilidade, VAR, relações preço/lucro, preço/valor patrimonial, beta, valor de mercado da empresa, etc.


Alguns exemplos

Pensando em facilitar o entendimento eu criei uma planilha (link abaixo) tendo como fonte a Economatica, para apresentar o desempenho dentro do modelo proposto. Não leve à risca meu levantamento porque os balanços registrados na CVM são padronizados e posso ter incorrido em erro de julgamento na hora de classificar uma ou outra conta da empresa como operacional ou errático, por exemplo no caso do uso do modelo francês. O mesmo pode acontecer na hora de apurar o famoso capital operacional empregado. Portanto, considere como meras aproximações meus levantamentos. O arquivo contempla algumas empresas listadas na B3, mas está longe de contemplar todas as empresas da bolsa. Finalmente, não custa lembrar que este arquivo não é indicação de investimento. Boa análise e espero ter ajudado!




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